10/11/2006

Estar de bem

Ontem foi dia (noite, melhor dito) de saída de gaijinhas. Destino: quanto mais fútil melhor. Por isso, destino: Amoreiras.
Assim que nos encontrámos senti-me em casa. Cada vez sinto mais que gostamos de estar juntas e que nos sentimos bem dessa maneira. Eu passei o tempo a espingardar os meus novos termos étnicos e a pronúncia da margem sul que não me custou a apanhar de ouvido: gaija boa é "cadeirrona" - entendam-se os rr como uma ligeira acentuação e não propriamente como o nosso rr convencional. Isto tem que se lhe diga.

Pesquisámos as lojas típicas para 4 moçoilas que procuravam botas e cremes.
Terminámos a busca numa perfumaria, da qual vim a perceber que existe: pó iluminador, que existe blush em creme, base em pó mate e base transparente em gel. Que os homens também já podem usar maquilhagem, que existem uns meteoritos luminosos por onde se passa o pincel que acentual as maçãs do rosto, que ele há tezes mais claras e tezes mais escuras e que a minha não se sai nada mal neste capítulo.
Senti-me como junto de 4 enciclopédias sobre todos os cremes e marcas que existem e eu um burro a olhar para um palácio e a comer pão-de-ló. Cada marca: La Prairie, Biotherm, Guerlain, Clinique tinha um produto fantástico que uma delas conhecia. A Cristina comprou uma base e enquanto levava uma ensaboadela da empregada-hiper-maquilhada-e-baseada-da-loja nós as três ficámos sozinhas. A experimentar tudo. Nas nossas caras e maçãs e lábios e decotes. E tudo.
Estávamos assim nós, eis senão quando, Kika balbuceia despreocupada: Eu se fosse a ti, a única coisa com que me preocupava era mesmo com os poros. E o burro deixa cair o pão-de-ló ao chão e o palácio desmorona-se à sua frente. "Mas que raio são os poros?" e "É claro, os poros!!!" foram os meus pensamentos simultâneos. Kika, quiseste dizer que eu tinha poros. Pois é, acertaste. Próxima busca: como curar os poros. Próxima descoberta: a clinique tinha um produto fantástico feito à minha medida. Um serum nocturno para fazer fechar os poros (nós só acreditamos nestas coisas quando estamos em frente a um vendedor que parece que nos está a falar dos milagres da IURD) e outro para os disfarçar. E pronto, ali estava eu, também com uma necessidade descoberta havia 5 minutos e, a partir de então, a achar que toda a minha vida gira à volta dos malditos poros do meu nariz e arredores. Agora sonho com o serum e com o disfarçador. Ainda não comprei nenhum porque sou bem comportada e quero comprar um de cada vez no mês.

E depois fomos embora com a promessa de regressarmos mais ou menos semanalmente ou consoante as necessidades de futeis de cada uma de nós. E ainda antes bebeu-se uma coca-cola light (pronto, eu comi um gelado no Mac).

E mais depois ainda deitei-me a pensar como ainda hoje tinha estado no tribunal a acompanhar um dos meus "rapazes do PIEF" que é arguido num processo devido a vários furtos de automóveis. Reparei que ele estava nervoso e que por isso gaguejava ainda mais. Não parava de mexer na sua orelha infectada por brincos sujos e promíscuos de outras orelhas e não parava de olhar para ver se a sua mãe chegava. Falámos pouco mas eu estive sempre ao pé dele. A mãe chegou mais tarde e não parou de falar. Ele apenas lhe pediu dinheiro e ela acedeu prontamente. Este era o rapaz que pior se dava comigo. Agora somos uns conhecidos cordiais. E ele já diz: "A s'tora Catarina é fixe". Em vez de dizer: "Oh diabo" e "pitbull" cada vez que me via.

Imagine-se, sentados à porta do tribunal, falei com ele sobre os assaltos que o meu carro já tinha sofrido. Ele ouviu-me e pareceu compreensivo. Pus-lhe um penso na orelha e pouco mais. E já deixei de ser um cão raivoso.

E entre um mundo e outro (o do fim e o do início do dia) balanço sem cair, a rodopiar entre uma e outra margem do Tejo e a dizer para mim: estou de bem.

1 comentário:

Anónimo disse...

acho que nao poderia descrever melhor a realidade de quem trabalha em PIEF... é como passar da noite pro dia em dois segundos, da miséria à tranquilidade num piscar de olhos. e penso que verás, como eu, que os momentos futeis serão boias de salvação, depois de pararmos de nos sentirmos culpados por termos vidão tão saudáveis (e saudavelmente cheias de problemas, ainda que diferentes dos dos nossos meninos..). o pior é a frustração de teres consciência que sermos "nós" ou sermos "eles" depende tanto de nós como... se chove ou faz sol.. estou a exagerar, mas é doloroso perceber que a diferença não está nas nossas qualidades ou princípios.. está na sorte de termos os nossos pais, a nossa familia, a nossa casa, os nossos amigos.. e não os deles.. resta-nos ajudá-los a retirar o melhor das piores vidas que têm.. beijinhos e bom trabalho! mais uma vez, bem-vinda! (e com isto me calo, finalmente! eheheh)